terça-feira, 5 de agosto de 2008

Pacavira: precursor do novo romance histórico angolano


NZINGA MBANDI, DE PACAVIRA: NOVO ROMANCE HISTÓRICO ANGOLANO


Rosangela Manhas Mantolvani1


RESUMO: O romance Nzinga Mbandi, de Manuel Pedro Pacavira foi publicado em 1975 e pode ser considerado o precursor do novo romance histórico angolano, pois possui em seu discurso alguns dos elementos germinais do gênero e o fator essencial: o embate entre os valores das sociedades tradicionais e os da sociedade mercantilista, de acordo com as teorias de Lukács sobre o romance histórico.


PALAVRAS-CHAVE: Pacavira; Romance Histórico; Literatura Angolana; Novo Romance Histórico.


ABSTRACT: The novel Nzinga Mbandi, by Manuel Pedro Pacavira it was published in 1975 and can be considered the precursor of the new angolan historical novel, therefore it possess in its speech some of the germinal elements of the sort and the essential factor: the shock between the values of traditional societies and the values of the mercantilist society, in accordance with the theorie of Lukács on the historical novel.


KEYWORDS: Pacavira; Historical novel; Angolan Literature; New Historical Novel.


1.O autor


Manuel Pedro Pacavira nasceu em 14 de outubro de 1939, na Fazenda Lá Luínha, no Golungo Alto. Filho de um alfaiate com uma lavadeira. Entrou para a Escola Primária aos 8 anos de idade e aos 14 fez a quarta classe sem reprovação. Em 1954 passou a ensinar na mesma escola onde estudara, devido à falta de professores; e, no ano seguinte fez um requerimento ao Governador Geral, pedindo autorização para freqüentar o Magistério Primário Católico “Teófilo Duarte”, na Cuíma, mas foi retido em Luanda pelas irmãs e primas que não quiseram deixá-lo seguir.
Matriculou-se no primeiro ano da Casa das Beiras, mas a mensalidade de 270$00 representava muito dinheiro para o pai e, no ano seguinte não consegue comparecer ao colégio. Retoma os estudos, mas falta aos exames. Passa então a trabalhar como auxiliar de contas na mercearia Agre & Ferreira e volta a freqüentar o curso no período noturno.
Em 1958 perde o emprego, mas freqüenta o teceiro ano do liceu graças à autorização da Diretora que lhe perdoa o pagamento de 350$00 de mensalidade.
Sua preocupação com os problemas do território angolano e a admiração com a evolução do nacionalismo lhe valeu ser chamado 'comunista' por um dos sócios da empresa no momento em que o colocava porta afora. Na época, procura entender o significado da filosofia Pan-Africana, da Revolução Cubana e a vida dos negros norte-americanos.
Tendo recebido um voto de confiança de Agostinho Neto em 1960, deslocou-se em maio para Brazzaville, no Congo, onde funcionava a base do MPLA – Movimento Popular de Libertação de Angola - e quando regressou em junho a Luanda foi preso, assim como Neto, sendo, no ano seguinte deportado para a Colônia Penal do Bié, no centro do país, e, posteriormente, transferido para o Campo de Concentração do Missombo, em Menongue, ao sul de Angola.
Em 1966 foi requisitado pela PIDE – a polícia política de Salazar – e acusado de atividades que abalavam os princípios de “recuperação psicossocial” no Campo de Concentração, sendo ele um “mau exemplo” para outros prisioneiros, mas consegue a liberdade em março de 1967, sendo preso novamente em setembro do mesmo ano. Em fins de julho do ano seguinte é deportado para Cabo Verde – Campo de Concentração de Tarrafal. Apesar de jamais ter sido julgado, foi libertado somente após o 25 de abril português.
Mesmo não tendo comparecido à Conferência Inter-Regional do MPLA em 1974, foi eleito membro do Comitê Central e, no ano seguinte foi escolhido para o cargo de Director do Departamento Nacional de Organização de Massas do Comitê Central do MPLA.
Em 1976 passou a Diretor dos Portos e Caminhos-de-Ferro de Angola e, no ano seguinte, ocupou o cargo de Ministro dos Transportes; em 1978, foi nomeado para o Ministério da Agricultura.
Entre suas principais publicações encontram-se Gentes do Mato, de 1974, pela África Editora, texto concluído na prisão quatro anos antes da publicação. Escreveu outros romances, um conto e apontamentos sobre as regras de ortografia do kimbundu. O romance Nzinga Mbandi foi publicado pela primeira vez em 1975 pela Atualidade Editora, em Luanda e a tiragem foi de três mil exemplares.


2. Nzinga Mbandi: novo romance histórico


Nzinga Mbandi conta a história da famosa rainha da Matamba que, no século XVII, assume o trono do avô Ngola Kiluanje, e não mede esforços para expulsar os portugueses instalados no entreposto comercial de Nossa Senhora de Assunção de Luanda – nome de Luanda na época - , quando estes intentam invadir seus territórios, chegando mesmo a tramar pactos com os holandeses na tentativa de expulsá-los e, apesar de obter êxitos em momentos diversos, mais tarde, já idosa, termina por estabelecer certos acordos que, certamente, seriam contrários à sua índole.
O romance se divide em três partes: na primeira encontra-se a chegada dos portugueses ao reino do Kongo e sua expulsão; na segunda a trajetória dos portugueses pelo Reino de Angola, mas principalmente a trajetória da filha de Ngola Ndambi [Nzinga] pelo espaço geográfico do território, conhecendo muitos povos e terras. No capítulo onze da segunda parte o narrador trata da transferência de D. Paulo Dias de Novais para as terras de Kakulu Kahangu, após ter recebido um ultimatum do Muene-Ngola para sair do Songa, quando então os portugueses impõem o terror nas redondezas. E Muene-Ngola sai em sua perseguição, juntamente com o Ngol'a Mata e um filho de Ngola Ndambi: o rei-soldado Ngola Kiluanji.
E assim a guerra se estende, pois chegam reforços de Portugal, mas as febres e os ataques dos locais reduzem os milhares de portugueses a apenas uma centena e meia. Embora quase destruídos, não desistem de chegar a Kambambi, onde se encontram as minas de prata e, mesmo pedindo socorro ao reino do Kongo, são quase dizimados. Em junho de 1585 estabelecem um castelo entre o rio Lucala e o Kuanza, cercado de rochedos, e formam a Companhia dos Empacasseiros, integrada por muitos negros e, continuam a atacar aldeias e sobados com o objetivo de chegar às minas de Kambambi. Às vésperas de Natal, em dezembro, um ataque surpresa de Ngola Kiluanji destrói um grupo de oitocentos empacasseiros e, em maio de 1589, morre D. Paulo Dias, por dedução no intradiscurso do narrador.
Aos guerreiros de Ngola Kiluanji juntam-se os Jagas, que eram povos que não possuíam um Império centralizado, mas seu território era constituído por muitos sobados e kimbos com administração relativamente independentes.
A articulação do discurso passa pelo crivo da memória, posto que no capítulo um da primeira parte, o narrador se refere aos processos de composição literária que se encontram no romance, referindo-se às formas de tratamento dispensadas à protagonista por figuras tão ilustres quanto El-Rei D. João IV, “chamavam-lhe Rainha Dona Anna, Rayña Singa [...], Ginga [...] mas o nome dela verdadeiro é esse mesmo que vem na capa: Nzinga Mbandi.”(PACAVIRA, 1975, p. 17). E, ainda, o narrador não se furta a ocultar suas “deduções” sobre a personalidade histórica:


Não devia ser mulher de se dar lá a essas fitas de puxar a cara, amarrar a testa, alçar os peitos, pôr o rabo a pino, e coisas outras dessas. Factos há que nos levam a pensar que ela cresceu bela, carinha bonita, alegre, simpática, sendo o seu defeito: virar bicha-fera-ferida, caso que lhe violassem um direito. Tanto é que uma formidável história ela nos deixou, uma história que mete respeito, o motivo que me traz a conversar aqui com vocês. Mas comecemos pelos tempos dos seus passados. (PACAVIRA, 1975, p. 17)


Nesse trecho, o narrador estabelece com o co-enunciador um diálogo, pois vai “conversar” com seu leitor, de tal maneira que o convida a mergulhar no passado. Essa, no entanto, constitui uma função conativa da linguagem a qual necessita que o leitor estabeleça um pacto com o narrador, ou seja, um acordo de que vai penetrar em um tempo muito distante daquele em que se encontra. E, assim, no capítulo um, o narrador entrevê em um português quase oral o encontro suspeitoso entre os portugueses – e as gentes de Angola à boca do rio Nzandi, em que as falas dos portugueses exaltam a boa-fé e a questão da religião. Já nessa passagem, o excesso de reverência parece falsear o conteúdo do que é de fato enunciado:


Que são muito boas pessoas, não vieram por mal, a ninguém querem fazer mal, antes pelo contrário. [...] Teriam já os da terra Dele ouvido falar? Jesus Cristo, seu nome. Filho de um Virgem. Teria já a estas terras chegado o seu eco?...


A fala de apresentação dos portugueses, com as mãos ao alto, parece repleta de ironia, se observarmos os significados ocultos em “antes pelo contrário”, que pode indicar tanto “a ninguém querem” equivalendo ao contrário de ninguém: “a alguém” ou “a todos”. De forma sutil, encontram-se no texto de Pacavira efeitos irônicos e cômicos encerrados no próprio código lingüístico e no discurso. E é o narrador quem responde pelos “da terra”:


Mas os da terra querem é saber de onde é que eles vêm, de que raça, de que nação, com uns ares de amalucados que aparentam, os cabelos parece que passaram no fogo, a cor da pele, tudo, tudo, um albino, filho-sereia. Com um falar que ninguém entende, ainda por cima. (PACAVIRA, 1975, p. 19-20)


A imaginação criativa do autor em torno do encontro insólito entre culturas de valores tão diferentes, cujas promessas de amizade e boa-fé tão enaltecidas num primeiro momento podem ser lidas como algo muito curioso, se considerado o momento de produção do romance: a década de 70, as perseguições da PIDE, e as sucessivas prisões do autor: encontro que recorda certos exertos em alguns novos romances históricos hispano-americanos – no momento em que muitos países latino-americanos encontram-se sob ditaduras de direita – sobre os primeiros contatos entre os ameríndios e Cristóvão Colombo.


3. Uma fábula que percorre cerca de quatro séculos


O romance se inicia a partir da aparição dos primeiros grupos portugueses não em Luanda, onde se instalariam, mas à entrada do Rio Nzaide. Seguindo para Mbanza-Kongo, os portugueses visitam o Muene-Kongo, e este teria sido o ano de 1482 e, ao partirem, os portugueses levaram com eles fidalgos do rei do Kongo, inclusive um filho do próprio rei.
Então, o capítulo Dois já se inicia com o ano em que os portugueses retornam ao território de Muene-Soyo, no rio Nzaidi, no ano de 1491, ao levarem para o Kongo muitos presentes ao rei, capitaneados por Rui de Sousa e comandados por Gonçalo de Sousa, que falece a caminho. Na oportunidade, o narrador trata de relembrar o batismo católico de toda Corte do Kongo, inclusive do rei e a mudança dos nomes em língua kikongo para a portuguesa – Nzinga Nkuvu para D. João. O narrador faz questão de, a partir desse momento, revelar a divisão de classes no interior do próprio reino do Kongo:


Mas nem todos assim se vestem – de finos panos, corpetes, manteletes, peles de onça ou de gato-bravo, carapuças nas cabeças, chicotes de gala ao ombro. Há os pobres, sem posses para isso. Pobres, pobres, são as suas vestes, Que nada mais têm de comum com as outros que o facto de serem da mesma matéria e mesma indústria. Panos de tecido de palama, produto dos teares da terra. À maneira estrangeira já se veste o Muene-Kongo. Assim também a Rainha, mais as moças com ela. E outros mais chegados a Mbanza. (PACAVIRA, 1975, p. 24)


O encontro das duas culturas e o exercício de influência de uma sobre outra, bem como a diferenciação entre os "pobres" e a elite que passa a imitar os modos e valores dos estrangeiros, demarca uma distância ainda maior que se instalaria entre os fidalgos em relação aos seus súditos.
A propagação da fé católica é discutida no capítulo três, bem como a influência que exerceram os padres na divulgação da doutrina cristã e sua ideologia, assim como as regras jurídicas, das quais não escapava nem mesmo o rei. E tudo parecia muito calmo, até que os nativos perceberam que havia roubos, coisa que jamais acontecera. Não apenas objetos, alimentos e valores, mas principalmente, pessoas desaparecem freqüentemente e o povo se revolta.
No romance, há exertos em português arcaico de cartas que o rei D. Manuel I, chamado ironicamente Muene-Putu, interessado também em fazer com que o Rei de Angola se "ffaça christão, asy a jente de sua terra, como he el rey do Comguo", o que na verdade parecia esconder uma outra verdade, que o narrador não revela, mas encontra-se implícita, um trabalho de desvelamento ideológico, ao enunciar o intradiscurso da carta do Rei de Portugal:


"Somos enformados que no dito regno d'Amgola à prata, porque se vy o per hunas manyllas que vyeram a nos del rey de Comguo: Trabalharês por saber parte domde he a dita prata, e asy de quaesquer outros metaes"2 (PACAVIRA, 1975, p. 32)


Dessa maneira, estavam lançados os germes divisionistas no interior das próprias comunidades tradicionais, considerando-se o fato de que as populações que pagavam tributos ao Império do Kongo, mas não eram kikongos, passaram a discordar da forma como as elites conduziam o reino. E o narrador trata de revelar as dissidências e causas das lutas que se disseminariam pelo território a partir da interferência dos portugueses e sua influência sobre a cultura do Kongo:


Uma corrente ouvia muito os estrangeiros que a dada altura começaram a procurar maneiras para tudo modificar no Kongo, suas instituições, títulos nobilitários, usos, costumes, nomes e até a maneira de pensar de cada pessoa. A outra se esforçava por desviar a mente de Nzinga Nkuvu de tudo que fosse estranho à terra. (PACAVIRA, 1975, p. 33)


Em uma facção, encontrava-se o filho-segundo de Muene-Kongo, Mpanzu e Nzinga, e os que se opunham à influência estrangeira; com o filho-primeiro: Mbemba a Nzinga, que se cercou de padres. Mas o filho segundo é quem triunfa, enquanto o mais velho foi afastado da Mbanza para as terras do Muene-Nsundi, e ali aclamado El-Rei D. Afonso I do Congo (o povo lhe chamava Afunzu).
Ao reclamar em carta direta ao rei D. Manuel I de Portugal, Mbemba a Nzinga atrai sobre si a ira dos padres, acusados de levarem "vidas escandolas de avareza e luxúria". (Idem, p. 34) O narrador detalha todos os jogos da Igreja com o objetivo de fazer permanecer no trono o representante que melhor lhe conviesse. E finalmente Mpudi a Nzinga, o último rei de uma série de subidas e destronamentos, termina por expulsar os jesuítas, enquanto o narrador se esmera em ironias, citando uma possível escrita dos padres: "Que melhor lhes era irem tentar o evangelho no Regno D'Angola. Um dia podia ser a subordinação do Regno do Conguo ao d'Angola pelo enfraquecimento daquele".
Os filhos da puta! (Idem, p. 35)


Em maio de 1560, a chegada de D. Paulo Dias de Novais3 – a serviço da rainha D. Catheryna de Portugal – em Kakulu, procurando trazer a "Civilização" e a religião aos kimbundus, é tratada com ironia pelo narrador que procura parafrasear entre português e kimbundo os questionamentos do rei de Angola, Ngola Ndambi, a respeito de tal civilização onde vivia a tal rainha:


[...] E a gente dessa Senhora Nda Katidina dia Mutudi4 como vivia? Como eram suas casas? Trabalhavam? Tinham lavras? E indústria? E afunantes? Ou passavam o dia todo na boa vida, sem fazer nada? Somente a comer, a beber, a dançar, e a falar desse Deus Senhor Jesus-Não-Sei-que, e a rondar as terras alheias dos outros? Assim como as pessoas de Kimbundu, assim também eram suas pessoas dela Nda Katidina dia Mutudi? Eram?...[...] (Idem, p. 49)


Paulo de Novais fica detido na Mbanza por seis anos, enquanto o Padre Gouvêa – agora Nganga Ngovêa –, que o acompanhava, termina por integrar-se à comunidade e se africaniza, "tinha virado mumbundu", mantendo, no entanto, a sua fé cristã. O narrador não se furta a tratar do diálogo religioso entre Nganga Ngovêa e Nganga Ndal'a Kabenda, o mais-velho dos mais-velhos de Kakulu, um "doutor das leis que os antigos nos deixaram", que fala ao padre sobre seu deus, Nzambi, criador de todas as coisas e adorado no Ndongo. Também fala sobre a morte e da inexistência do Inferno para os kimbundus. E do mau espírito: Mbungula. E não escapam novamente à ironia os portugueses, chamados ndele, significando não o "pássaro branco", mas "uma alma danada que vagueia pelo mundo inteiro, sem lugar de estar, sem terra, sem nada. Um espírito mau atormentado por males [...] E vive agora a atormentar as pessoas, lhes perseguindo, lhes sacrificando de todas as maneiras." (Idem, p. 57)


Nesse capítulo, como em outros que se seguem da segunda parte do romance, os valores das tradições das comunidades angolanas são sempre colocados em contraste com os valores dos brancos ao longo do intradiscurso do narrador, enquanto alguns discursos de certas personagens organizam um universo particular em kimbundo, impenetrável ao leitor que não domina a língua.
A ironia e o humor não se afastam das cenas em que se discute o código lingüístico e seu caráter de "desencontro" de não-interpretação, pois, segundo Dominique Mangueneau (.....), sempre que há uma incompreensão excessiva no processo de interpretação, o efeito cômico, geralmente, encontra-se garantido. Em Pacavira, isso ocorre algumas vezes, como nessa passagem e em outras em que discutem sobre os significantes, a exemplo do significado de "cometa":


Nganga Ndal'a Kabenda diz:
- Ah... Tetemba dia mukila. Estrela-de-rabo.
- E na língua do Nganga Ngovêa? Cometa
- Di' hi?
- Cometa.
- Ah! ... Dicometa.
- Não é "dicometa", não. Dizei: Co-me-ta. Dizei comigo, experimentemos:
- Co...
- Co
- Me
- Me
- Ta
- Ta
- Ajuntai...
- Dicometa. (PACAVIRA, 1975, p. 57-8)


A resistência do código, cuja estrutura gramatical parece impenetrável à estrutura do branco concretiza na escrita a resistência que se seguiria na prática mesma, por meio da religião, de certas formas de viver e pensar e, ainda, pelas armas.
No capítulo quarto da segunda parte, a narrativa estabelece uma ruptura temporal de quinze anos, e trata dos acontecimentos de 1575, anunciando as intensas guerras no território do Kongo, motivadas pela ideologia do mercantilismo, o que fez com que D. Sebastião autorizasse o Cardeal D. Henrique, senhor-mor da Inquisição em Portugal, a enviar uma esquadra para combater os rebeldes do Kongo e restituir o trono ao rei cristão, d. Álvaro I, "tributário e vassalo do rei de Portugal". Mas uma analepse remonta o texto a 1570, ou seja, cinco anos antes desses acontecimentos, para contar o que se passou em Angola nesse momento histórico, tendo em vista que o narrador faz questão de demarcar os espaços geográficos entre o reino do Kongo e o reino d'Angola.
Do capítulo quatro ao sete, o narrador remete o leitor ao momento do encontro entre o enviado do Rei de Angola à Ilha de Luanda, onde se encontra D. Paulo Dias de Novais, e o momento em que explode a guerra, tratando da mudança do fidalgo português para a barra do Kwanza, o que vem a trazer preocupação ao Ngola Mata, filho de Ngola Ndambi, já falecido. Das fortificações da Mbanza à construção de quilombos e ninhos de espionagem, o narrador trata de mostrar o crescimento da pequena "quilumba", a filha de Ngola Ndambi: "Sinuosa, cara alegre, voz molhada e quente. Fazia guerra com seus três quatro cinco seis anos para vir a Mulemba com o avô [...]". Assim apresenta o narrador a infância de Nzinga Mbandi.
As movimentação dos portugueses em direção a Mpungu a Ndongo e o prenúncio de guerra – após o incêndio de Kambambi pelos portugueses – coloca muitas povoações em movimento para auxiliarem o rei de Angola:


E manhã clara: movimento enorme de povoações que se deslocam. Homens e velhos e mulheres e crianças e coxos e manetas, servos e não-servos, mal-ajeitados e bem vestidos [...] Os motivos desse movimento todo? Sanzalas a se despovoares assim?... Sanzalas e segues e sambas de sobas pelo que se vê?... Os motivos?...
O mindele! A-tu-lu!...
Os brancos! (PACAVIRA, 1975, p. 79)


No romance, Pacavira desvela a luta entre as culturas, entre as nações, ou seja, a história do homem como resultante da luta de classes, grupos, nações, desvelando que o sistema econômico e social e suas tecnologias de domínio são os responsáveis pelas condições materiais de vida dos povos, sejam eles dominantes ou dominados. Ao revelar as causas que levarão às guerras contra os portugueses no território angolano, o narrador explicita que nenhuma violência é gratuita, porque há sempre um episódio que pode justificá-la.
De Kukala havia partido a comitiva de Nga Ngeng'a Muhondo, o Tandala do Reino de Angola, acompanhado da própria filha do Ngola, percorrendo as terras de Entre rios, no Mahungu, seguindo pelas terras de Ndembu Kitexi, ou Jagas, entre os rios Ndanji e Lufuni, chegando até o Lufuni, onde viviam os Lugangos, espécies de banqueiros ou cambistas africanos, pois teciam uns paninhos de mabela, os lumbongos, um tipo de moeda africana. Chegam às freguesias do Lufuni, onde se fala kimbundu e kikongo. Depois de atravessar o Ndanji, atravessam a Kilunda e, depois, a Hong'a Zanga até pararem nas terras de Kakulu Kahangu que, entre comemorações, deixa claro aos visitantes de Nzinga que não aceita os estrangeiros - portugueses.
Dirigindo-se à Kisama, fica ali até novembro – kamoxi – e partem para o Kuanza acima em direção a Mapungu a Ndongo, local em que nasceu Ngola Ndambi e seus filhos. Nessa ocasião, o narrador trata de descrever as cenas de comércio à beira rio, para onde afluem as populações de várias comunidades locais para comercializar com alguns portugueses que vivem por ali. Os costumes e os cantos em kimbundo à roda do mussualo encontram-se presentes nesse romance que se constitui a partir de uma mescla de gêneros orais e textuais. "Ngadiuana, ngadiuan'â / Ngadiuana, ngadiuan'â uá!... [...] (Idem, p. 99-102)
Na construção da heroína, o narrador faz sua personagem percorrer grande parte do território angolano, estabelecendo o princípio da viagem e outorgando a ela a experiência e conhecimento tanto geográfico quanto social do território e da diversidade que mais tarde viria a governar, ou seja, esse é o momento em que a protagonista se expõe à experiência e ao conhecimento.
No capítulo onze iniciam-se os preparativos para a guerra contra os portugueses que não se cansam de pilhar e destruir os que não lhe podem oferecer resistência, despovoando muitas comunidades tradicionais. A descrição das desgraças a que se encontram submetidos os kimbos desvelam o que significou a colonização em Angola, tendo em vista que o assentamento de fortalezas e castelos, bem como a cidade de Massanganu não visava tão-somente ao tráfico de pessoas para os engenhos do Brasil, mas a exploração e apropriação das minas de metais preciosos.
O capítulo Doze trata da transição do Governo a D. Francisco de Almeida, indicado já por Felipe I da Espanha, pois Portugal encontra-se sob o domínio espanhol, período político chamado de União Ibérica, mas o soba Kafuxi não dá trégua aos portugueses e outro Governador, Jerônimo de Almeida, desiste da empreitada naquele momento. A sucessão de Governadores não tem fim.
O falecimento de Ngola Kiluanji permite que o filho assuma seu lugar, mas muda-se para Mbaka, onde é atacado pelos portugueses e, acuado, retira-se para o Kuanza adentro, em Kindonga. Por essa época, os portugueses já haviam se instalado completamente em Luanda. Aliados a Samb'a Tumba – líder local caricaturizarizado pelo narrador – é indicado para substituir o filho de Kiluanji e os portugueses contam com essa ajuda para conseguir explorar as terras do interior, mas o povo não o aceita como Ngola. Assume então o trono a neta de Ngola Ndambi, filha de Ngola Kiluanji Kia Samba, Ngola Nzinga Mbandi. Sobre a protagonista já adulta, diz o narrador:


Alegre, jovial, no vigor da vida, sem cabelos brancos, sem nada. E sem nada que lhe dobre. [...] Nos seus quarenta anos – com vinte e tal anos de andar para trás e para diante. De andar aonde só os filhos-de-pássaros dantes podiam passar. E dormir aonde só podiam os bichos dormir [...] (Idem, p. 118)


Indo a Luuanda encontrar-se com o governador português João Correa de Souza (isso teria ocorrido em 1621), retorna da cidade com o nome de Ana de Sousa, dado em batismo católico, o que provocou um descrédito por parte dos súditos da rainha. Mas a rainha volta e nomeia muitos sobas para controlar o território que lhe cabe. E, um mês depois, manda recado ao sr. Bento Banha Cardoso, em que diz:


" [...] o nome Ana de Sousa que o outro quis oferecer não pegou. Não podia pegar. O mesmo sucede com as minhas irmãs, a Kambo não quer o nome de Bárbara, a Fuxi manda dizer que seu nome é mesmo Fuxi. Que ide aplicando o nome de Engrácia às vossas filhas que is parindo, vós outros [...]" (Idem, p. 128-9)


E, no conteúdo da Carta a certeza de que Ngola Nzinga lhes fará a guerra, pois "armas não nos faltarão, e povos haverá neste mundo capaz de acudir a um apelo nosso, para vos correr com ferro e fogo" (Idem, p. 129). No capítulo quinze, Nzinga se desloca para a Matamba. Dois anos e meses depois de deixar a Kindonga, Nzinga sai com seu séquito até as terras da Lunda, onde entra em contato com o rei daquele território, Sa-Yiala Maku. Nessa ocasião, o narrador toma os significantes dos falares da Lunda, ao tratar Nzinga como Mwana Ngana Na-Chiluachi cha Zinga e nessa ocasião são contadas as desavenças do reino da Lunda e a traição de um de seus membros que vivia em outras terras, aliado aos portugueses.
O narrador não se furta a retratar o heroísmo da protagonista quando, no capítulo Dezesseis da segunda parte, ao serem os kimbundos liderados por Nzing'a Mona no Alto Kuangu, tendo este sido atingido, é a própria rainha quem lidera o contra-ataque:


[...] Mas é a própria Ngola que vai lhes ficar à frente do combate. Aí ela vem a descer as quebras de arco e lanças na mão, sem os panos já, apenas de jihondo, com uns corpetes também em franjas de fibras de imbondeiro e lhe vestir os peitos. Entesa o arco, larga... lá vai a sua lança de mistura com a quantidade de lanças a cair sobre os contrários parecendo chuva de pedras. (Id. Ibid., p.147)


Apesar do heroísmo da protagonista, nessa ocasião são raptadas suas irmãs: a Fuxi e a Kambo; e ainda, uma tia da rainha pelos portugueses, motivo pelos quais as guerras se intensificam, pois aumenta a ira de Nzinga Mbandi contra os estrangeiros.
A exploração comercial e a rapinagem por parte dos portugueses no território angolano não têm limites, chegando mesmo a cogitar a idéia de cunharem uma moeda própria em substituição aos lumbongos locais, apoderando-se também do sistema monetário de trocas, enquanto o povo se queixa constantemente. As condições materiais de existência dos povos funciona como fio discursivo no texto de Pacavira e, embora compreendendo os valores da cultura angolana, procura enfatizar as questões econômicas, políticas e ideológicas. Por isso, as condições de trabalho impostas a alguns locais que aceitavam servir aos invasores ou eram por eles cooptados não escapa ao olhar crítico do narrador:


Se o senhor de um arimo era pai-de-família, cada filho tinha que ter o seu escravo para lhe levar nas costas. As raparigas com a sua masseca. A senhora dona com a sua criada para lha abanar e lhe lavar os pés e não-sei-mais-onde. Fora a quantidade de lavadeiras e cozinheiros e aqueles que lhes serviam às mesas. Com outros que lhes varriam os quartos e lhes esfregavam o chão. [...] Não entravam nesta conta as remessas de caras negras outras muitas que tinham amontoadas ou nas caves do paço ou nos armazéns ao lado – à espera de naus a vir do Brasil despejar gentes e máquinas de guerra. [...] (Idem, p. 154)


O homem como mercadoria, vendido como máquina de produção à elite colonialista na América tornou-se o principal negócio de enriquecimento do colonialismo em África. Assim, o sistema de capital mercantil-escravista português é explicado de uma maneira tão simples que qualquer leitor pode compreender o triângulo entre uma classe de mercadores e fidalgos que aspirava viver de forma aristocrática tanto no Brasil-Colônia quanto no território angolano e, quando enriquecidos, retornar a Portugal como milionários e heróis.
A cobrança de dízimos pelo capitão-mor de cada região ao soba avassalado também é discutido no romance, ou seja, Pacavira justifica a ocorrência de tantas guerras em uma terra expropriada por forças invasoras. Por todos esses motivos, os guerreiros kimbundos tratavam de incendiar as matas, revoltosos com a situação, pois "filhos da terra, que perdiam a noção dos valores e dignidade de homem tocam a negociar os sobrinhos, os filhos, os irmãos [...] " (Id. Ibid., p. 156)


A morte de D. Álvaro IV, rei do Kongo e o assentamento de Kimpaku, o novo Muene-Kongo permite uma aliança entre este Império e o de Angola, o reino da Matamba. Em Portugal, por essa mesma época, um novo monarca senta-se ao trono, enquanto no Brasil, os colonos desejam a expulsão dos jesuítas que lhes impedem de escravizar os ameríndios. Pacavira parafraseia, então, um trecho de uma das Cartas do Padre António Vieira ao rei de Portugal: "Em quarenta anos se haviam matado e destruído, na costa e nos sertões, mais de dois milhões de índios e mais de quinhentas povoações como grandes cidades".
Kimpaku, o Muene-Kongo ativa relações com os holandeses que andavam sempre "em visita" às costas angolanas, desde que a Colônia de Brasil fora tomada pelos holandeses (1630 a 1554 – ocupação de Recife e Olinda, em Pernambuco; 1637-1644 – ocupação de São Luiz do Maranhão), considerando-se de 1630 a 1637 ocorreu o período de resistência à armada da Companhia das Índias Ocidentais, de Capital neerlandês, cuja empresa multinacional havia obtido dos Doze e do governo de Holanda uma autorização de exploração das Colônias então pertencentes a Portugal, pelo período de vinte e quatro anos, com o objetivo de restabelecer o comércio de açúcar com a Europa.
Assim, Pacavira detém-se sobre os acontecimentos em torno da invasão holandesa, quando o reino do Kongo e o de Angola se unem a estes contra os portugueses. Os holandeses invasores ocupam Luanda e Benguela, enquanto os portugueses se retiram para o interior, principalmente Massangano e outras fortalezas.
Na terceira parte, o autor trata dos acordos entre os Impérios locais e os holandeses, a libertação das irmãs de Nzinga que se encontram detidas em Massangano, sendo a Fuxi assassinada pelos portugueses nessa ocasião. E assim termina a narrativa assinada pelo autor, escrita entre outubro de 1972 e janeiro de 1973, no Campo de Trabalho de Chão Bom, Tarrafal, na Ilha de São Tiago (Santiago), no arquipélago de Cabo Verde.
No entanto, para efeito de informatividade, o que parece ser uma questão fundamental para Pacavira, encontra-se ao final do livro uma espécie de resumo histórico que abarca os períodos de 1647 a 1890, cujo autor não seria Pacavira, mas Kakulu Ka Henda Ka Mona, em que se narra alguns acontecimentos após a expulsão dos holandeses pelos portugueses, e a posterior aliança destes estabelecida com alguns locais ressentidos de seus direitos durante a ocupação holandesa ou mesmo por ganância, quando os portugueses conquistam posições definitivas no território angolano. Em 1656 desejam um acordo de paz com a rainha da Matamba, em que a reconheciam como senhora de suas terras.
Segundo o narrador, Nzinga Mbandi Ngola "morreu em 1663, em 17 de Dezembro, com 81 anos de idade", transformando-se posteriormente em um símbolo da resistência das comunidades tradicionais em África, constituindo uma tarefa quase impossível dissociar sua atuação na história de sua aura mítica e lendária, cujas façanhas eram contadas de geração a geração, como forma de guardar uma das facetas do poder heróico de certas mulheres.


4. O jogo de tensões no texto


O romance Nzinga Mbandi é dedicado às FAPLA – Forças Armadas Populares de Libertação de Angola - “Heróicos Combatentes da Liberdade”. Já em seu “A modos de Introdução”, o autor cita Paulo VI (1973, p. 8), no texto L' Observatore Romano5, em que o papa enfatiza a questão e a necessidade da paz, criticando os Imperialistas ao admitir que “isto certamente não é fácil, especialmente quando uma grande parte da economia mundial e da organização dos povos se funda sobre o poder das armas e sobre os critérios de emulação de uns sobre os outros”.
A partir da Dedicatória e da Epígrafe encontra-se o jogo de tensões instalado no romance que, já nesse início revela o grande desejo de paz e, ao mesmo tempo, sua impossibilidade representada pelo exercício da emulação de uns sobre outros, ou seja, a competição e a rivalidade, esta entendida aqui como a expropriação dos que não possuem armas para se defender daqueles que possuem sofisticadas tecnologias de guerra.
No aspecto da linguagem, ou especificamente, do código lingüístico, Pacavira instaura um narrador que possui um português próximo da oralidade do português-padrão, enquanto as falas das personagens se apresentam em kimbundo, ou mescladas ao português, às vezes em umbundo, enquanto vez ou outra, o narrador se esmera em comentários metalingüísticos, sem a preocupação de uma tradução oficial para o português de muitos dos comentários em línguas locais. Isso nos autoriza a compreender que Pacavira escrevia para um público bilingüe, ou seja, seus iguais, capazes tanto de entender português quanto kimbundo ou outras línguas locais.
Essa forma bilingüe do romance plasma a forma mesma das sociedades daquela época, considerando-se que, no século XVI, somente os que viviam em contato com os europeus nos entrepostos de tráfico de escravos é que dominavam a língua portuguesa. Por isso, as personagens de Pacavira falam, tantas vezes, em kimbundo. No entanto, o autor não pode utilizar esse único código em sua escrita, pois seus leitores são falantes de língua portuguesa.
Parece clara, então, a posição do narrador como sujeito inserido nas duas culturas que, aparentemente neutro, não deixa de ser irônico em muitas trechos do romance, apesar da seriedade com que é tratado o assunto e de todo respeito que nutre pela figura histórica da protagonista, desvelado no discurso do narrador.


Notas
1Doutoranda em Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa. Área de Teoria Literária e Literatura Comparada. FFLCH- Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP – Universidade de São Paulo – SP. Tese: Das invasões às fogueiras: os discursos exocêntricos de Pepetela e Saramago. Orientadora: Profa. Dra. Tania Celestino de Macêdo.
2No texto, Pacavira não especifica os documentos que teriam sido consultados e de onde teriam sido recortados tais textos, mas o provável é que essas cartas façam parte dos primeiros documentos oficiais portugueses relacionados à conquista de Angola, aos quais talvez possamos ter acesso.
3D. Paulo Dias de Novais, fidalgo da Casa Real de Portugal, neto do navegador Bartolomeu Dias.
4Essa era a forma usada pelo rei de Angola para chamar D. Catheryna, a Rainha viúva.
5PAULO VI, L' Observatore Romano. Ed. Semanal em Português, 7 de janeiro de 1973, p. 8.

3 comentários:

Unknown disse...

Excelente exposição sobre um dos grandes vultos que sempre admirei da realidade Angolana cujo tributo para o melhor conhecimento da história de Angola é notável. Fernando Camacho

Mantolvani, R. M. disse...

Obrigada, Fernando, pelos elogios. Creio que Pacavira realmente elucida muito da História de Angola. Mas é literatura, mesmo.

Orlando Castro disse...

«Com tanto que se tem falado, será que não sabem quem é Manuel Pedro Pacavira?», pergunta Dalila Cabrita Mateus, acrescentando que “Nito Alves, nas suas «13 Teses», acusava-o de ser informador da PIDE e colaborador na célebre «Tribuna dos Muceques», editada pela PIDE”.

Além disso, diz Dalila Cabrita Mateus, “os arquivos existentes da Torre do Tombo, a propósito deste panfleto, falam de um Manuel Pacavira”.

Depois disso, ainda segundo a autora de “Purga em Angola”, “terá tido papel destacado na orgia de sangue que se seguiu aos acontecimentos do 27 de Maio de 1977”.

“Claro que foi membro do Comité Central e do Bureau Político e é Embaixador. Era um dos vencedores, pois claro”, conclui Dalila Cabrita Mateus.