quarta-feira, 12 de outubro de 2016


INCIDENTES DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS: UMA GARANTIA DE ISONOMIA DAS DECISÕES NO NOVEL CPC

 


 Adaiton Bertoldo Alves
Daniel Ferreira da Silva
Francisco A. Guimarães Filho
Janaína Bantovani Ramos
Rosangela Manhas Mantolvani


Resumo:
            Esta abordagem trata das origens dos incidentes de resolução de demandas repetitivas – IRDR -, inaugurado no direito brasileiro pela Lei 13.105, de 2016, cujos pressupostos se encontram em costume diverso do que embasa a estrutura do nosso código civil, e busca elucidar as diferenças entre quaisquer outras formas que se lhe assemelhem em outras escolas de direito, estabelecendo um breve e sucinto paralelo entre o instituto da common law e da civil law, especialmente nos pontos que dizem respeito à admissão de incidentes, suas origens e necessidades, bem como a importância deste instrumento no processo civil brasileiro e as consequências do mesmo tanto para os Tribunais, a segurança jurídica, as partes envolvidas no processo, seus patronos e outros que estejam de alguma forma envolvidos neste instituto do IRDR.



1.   Introdução

O sistema jurídico brasileiro, forjado para as demandas do povo brasileiro, foi principalmente articulado a partir de códigos de Leis já existentes anteriormente, especialmente a partir do direito proveniente das Ordenações instituídas pelos reis portugueses, e, mais tarde, sob a influência do direito francês e do alemão.
Por este motivo, muitas de nossas leis provêm de normas legais alienígenas, ou seja, de outros países que nem sempre possuem similaridades culturais com nosso povo, nossos valores, nossa materialidade, nossa percepção do mundo.
Na Idade Média formam-se os principais conjuntos de ideias que norteariam as atuais vertentes do direito, conhecidas pela nossa sociedade na atualidade, visualizadas sob os sistemas da civil law e da common law.
São duas grandes tradições jurídicas: uma oriunda dos cânones do Direito Romano, o sistema civil law, que se sedimentou em toda Europa Ocidental, a partir da cultura de romanização, iniciada por volta dos séculos XII e XIII; outra oriunda do direito costumeiramente aplicado.
Na primeira, o legado do direito canônico-românico, a tradição desenvolveu-se por meio do ensino do Direito nas Universidades, e manteve-se, atendendo às demandas de segurança jurídica do comércio que ultrapassava os territórios dos Estados Nacionais, garantido, assim, pela aplicação das normas canônicas.
É importante observar que as disciplinas ensinadas nestas Universidades, surgidas na Idade Média, por questões de constante aplicação, solidificam-se na Renascença, devido ao Comércio transnacional, e à expansão do mercantilismo (capitalismo comercial); é o direito formado pelo direito romano em conjunto com o direito canônico que embasam o que se aprende, enquanto os direitos próprios dos Estados Nacionais são relegados a segundo plano, de acordo com David (2002, 43-4).
No Direito romano, a regra jurídica era sempre extraída dos casos concretos, tal que se pudesse obter uma classificação e, posteriormente, eram aplicados aos casos futuros. Importante ressaltar as diferenças temporais entre a civilização romana e as que se apropriaram do Código e o aplicaram, tal que nem sempre a lei aplicada se adequava à realidade. Sob esta perspectiva, a jurisprudência se revelou pela interpretação, sempre de forma criadora, organizando novas leis de modo a atender o direito das pessoas.
De outro lado, oriunda das decisões dos Juízes, disponível a todos os cidadãos da Inglaterra, forjava-se o costume sobre as resoluções das demandas que se apresentavam aos Juízes, o que se denominava common law, ou “direito comum”, tratando-se de um direito costumeiro, originado nos Tribunais de Westminster.



2.   Direito no Brasil

No Brasil, o que se verificou durante muito tempo foi exatamente a ausência de um tratamento comum, uma vez que a uniformidade não existia na aplicação a cada caso concreto, embora se buscasse de alguma maneira não praticar injustiças, porém, a vontade real, direta ou indiretamente prevalecia sobre os escritos da Lei.
Sabe-se que as Ordenações, na realidade, não resumiam todo o Direito aplicado na Colônia, que, até a vinda da família real, contava com Ouvidores cíveis e criminais para solucionar as questões que surgiam sobre direitos das pessoas nas Colônias.
A partir da instalação da Corte portuguesa no Brasil, as questões de Justiça ficaram a cargo dos Juízes que vieram juntamente com a família real, os fidalgos e  os seus serviçais, de maneira que o Judiciário se modificou na Colônia. A elevação do Brasil a Reino Unido a Portugal e Algarves tornou a aplicação dos códigos uma necessidade para manter o aspecto de Estado absolutista, mesmo fora dos contornos europeus.
Juntamente com as Ordenações Filipinas, eram aplicados também as fontes normativas:
a)   A Lex Romana Wisigothorum” – direito comum dos povos germânicos;
b)   Os Privilégios – direitos assegurados aos nobres pelos reis;
c)   As Forais – leis particulares locais, asseguradas pelos reis.”(CEZARIO, s /d)

Como se observa, os códigos das Leis provinham das mais diversas fontes e, por isso, a miscelânea de Leis fazia com que sua aplicação ao caso concreto variasse muito, apresentando diferenças nas sentenças para o mesmo caso, por motivos diversos, iniciando-se na pessoa do cidadão que recebia o direito ou cumpria a obrigação, uma vez que a lei não era igual para todos (os nobres tinham código diferenciado); em segundo porque o julgamento não atendia a qualquer padrão. Cada caso era um caso. E julgado de forma diferente. Vez e outra, apelava-se para algo que se encontrava já sedimentado no costume do povo e utilizava-se como molde ou modelo para solicitar algum direito que não estivesse claro na Lei.
As diferentes origens dos códigos que governavam o direito da época também dificultavam qualquer padrão para que houvesse qualquer segurança jurídica, além de que não somente o Judiciário dizia o Direito, mas também o Rei.

a)    Juízes da Terra (ou juízes ordinários) – eleitos pela comunidade, não sendo letrados, que apreciavam as causas em que se aplicavam os forais, isto é, o direito local, e cuja jurisdição era simbolizada pelo bastão vermelho que empunhavam (2 por cidade).
b)    Juízes de Fora (figura criada em 1352) – nomeados pelo rei dentre bacharéis letrados, com a finalidade de serem o suporte do rei nas localidades, garantindo a aplicação das ordenações gerais do Reino.
c)    Juízes de Órfãos – com a função de serem guardiões dos órfãos e das heranças, solucionando as questões sucessórias a eles ligados.
d)    Provedores – colocados acima dos juízes de órfãos, para o cuidado  geral dos órfãos, instituições de caridade (hospitais e irmandades) e legitimação de testamentos (feitos, naquela época, verbalmente, o que gerava muitos problemas).
e)    Corregedores – nomeados pelo rei, com função primordialmente investigatória e recursal, inspecionando, em visitas às cidades e vilas que integravam sua comarca, como se dava a administração da Justiça, julgando as causas em que os próprios juízes estivessem implicados.
f)     Desembargadores - magistrados de 2ª instância, que apreciavam as apelações e os recursos de suplicação (para obter a clemência real). Recebiam tal nome porque despachavam ("desembargavam") diretamente com o rei as petições formuladas pelos particulares em questões de graça e de justiça, preparando e executando as decisões régias. Aos poucos, os reis foram lhes conferindo autoridade para tomar, em seu nome, as decisões sobre tais matérias, passando a constituir o Desembargo do Paço.” (CEZÁRIO, s /d)


É na miscelânea de tradições que o direito brasileiro se sustenta e, por este motivo, muitas de nossas leis provêm de normas que nos parecem estranhas, ou seja, de outros países, e revela, por vezes, nos códigos ausência de similaridades culturais com os jurisdicionados, com nossos valores, nossa materialidade e nossa percepção do mundo.
Na Idade Média formam-se os principais conjuntos de ideias que norteariam as atuais vertentes do direito, conhecidas pela nossa sociedade na atualidade, visualizadas sob os sistemas da civil law e da common law.
São duas grandes tradições jurídicas, uma oriunda dos cânones do Direito Romano, o sistema civil law, que se sedimentou em toda Europa Ocidental, a partir da cultura de romanização, iniciada por volta dos séculos XII e XIII.
Este legado do direito canôninco-românico desenvolveu-se por meio do ensino do Direito nas Universidades, e manteve-se, atendendo às demandas de segurança jurídica do comércio que ultrapassava os territórios dos Estados Nacionais, garantindo, assim, pela aplicação das normas canônicas.
É importante observar que as disciplinas ensinadas nestas Universidades que surgem na Idade Média e se solidificam na Renascença, devido ao Comércio transnacional, e a solidificação do capitalismo comercial, é o direito formado pelo direito romano em conjunto com o direito canônico, enquanto os direitos próprios dos Estados Nacionais são relegados a segundo plano, de acordo com David (2002, 43-4).
No Direito romano, a regra jurídica era sempre extraída dos casos concretos, tal que se pudesse obter uma classificação e, posteriormente, eram aplicados aos casos futuros. Sob esta perspectiva, a jurisprudência se revelou pela interpretação, sempre de forma criadora,  
De outro lado, oriunda das decisões dos Juízes, disponível a todos os cidadãos da Inglaterra, denominava-se common law, ou “direito comum”, tratando-se de um direito costumeiro, forjado nos Tribunais de Westminster.



3.   Demandas Repetitivas

Mas, afinal, o que são resoluções de demandas repetitivas? São reiteradas decisões de Juízes vários sobre o mesmo caso, de maneira que difiram estas sentenças de um Juízo para outro, inúmeras vezes, no interior do mesmo Tribunal. Assim, a decisão tomada por um determinado Juiz diverge da decisão de um outro, ou de outros, sob o mesmo Tribunal, tal que afete a segurança jurídica e, certas vezes, a isonomia.
         Após delimitar o procedimento adotado pelos Juízes, temos que a repetição de não-similaridades entre uma resolução e outra,(não podendo os casos resumirem-se a números insignificantes), torna-se possível o uso do novo instrumental.
A aplicação do novo instrumento de uniformização apontado na Lei 13.105, de abril de 2016, viabiliza a superação de décadas de inconformismo dos operadores do direito face às divergências de decisões finais, oriundas de casos similares, em demandas que se repetiam por diferentes Tribunais, Brasil afora.
Assim, no capítulo VIII, do novel CPC, garante-se que:

Art. 976 - É cabível a instauração do IRDR quando houver simultaneamente:
I – efetiva repetição de processos que contenham a mesma questão unicamente de direito
II – risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.
§ 1º A desistência ou o abandono do processo não impede o exame de mérito do incidente.
§ 2º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono.
§ 3º A inadmissão do IRDR por ausência de qualquer de seus pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja o incidente novamente suscitado.
§ 4º É incabível o IRDR quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, há tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva.
§ 5º Não serão exigidas custas processuais no IRDR. (Lei 13.105-2016)

A consagração deste meio de interferência no curso da ação pode solucionar questões polêmicas, oferecendo um tratamento mais igualitário ao jurisdicionado, que espera ver seu direito atendido, e principalmente, receber o mesmo tratamento do seu Outro.
O Projeto do Novo Código de Processo Civil permitirá que se superem décadas de existência de casos em que eram proferidas decisões finais divergentes provenientes de casos similares, ao consagrar o Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas, instrumento de uniformização.
O IRDR vem para uniformizar a solução de questões reiteradas, que tratam de idêntica matéria, como se observa:

Art. 982, I, CPC – Admitido o incidente, o relator:
I – suspenderá os processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no Estado ou na região, conforme o caso;
II – poderá requisitar informações a órgão em cujo juízo tramita processo no qual se discute o objeto do incidente, que as prestarão no prazo de 15 (quinze) dias;
III – intimará o Ministério Público para, querendo, manifestar-se no prazo de 15 (quinze) dias.
§ 1º A suspensão será comunicada aos órgãos jurisdicionais competentes
§ 2º Durante a suspensão, o pedido de tutela de urgência deverá ser dirigido ao juízo onde tramita o processo suspenso.
§ 3º Visando à garantia da segurança jurídica, qualquer legitimado mencionado no art. 977, incisos II e III, poderá requerer, ao tribunal competente para conhecer do recurso extraordinário ou especial, a suspensão de todos os processos individuais ou coletivos em curso no território nacional que versem sobre  a questão objeto do incidente já instaurado.
§ 4º Independentemente dos limites da competência territorial, a parte no processo em curso no qual se discuta a mesma questão objeto do incidente é legitimada para requerer a providência prevista no § 3º deste artigo.
§ 5º Cessa a suspensão a que refere o inciso I do caput deste artigo se não for interposto recurso especial ou recurso extraordinário contra a decisão proferida no incidente. (Lei 13.105-2016)


A suspensão de todos os processos que apresentem a incidência de divergência em decisões de demandas idênticas e repetitivas se mostra obrigatória para que se possa providenciar resolução adequada e isonômica, porém, é mantido o pedido de tutela de urgência, mesmo durante o período de suspensão. Este recurso que solicita a suspensão pode ser conhecido de qualquer legitimado e, principalmente, da parte no processo.
O instrumento possui função social, uma vez que se apresenta imbuído do fim de promover isonomia, economia processual àquelas demandas em que se discute a mesma questão de direito.
Organiza-se especialmente como um mecanismo formador de precedentes vinculantes, porém terá sua vinculação no órgão julgador do incidente apontado como existente.
É pela efetiva repetição de processos, em que figurem as mesmas controvérsias de direito, e desde que fique demonstrada a insegurança jurídica, aliada a elementos que apresentem decisões conflitantes, que basicamente se oferecem as condições para o cabimento do IRDR, de acordo com o artigo 976, do Novo CPC.
A partir do momento que o incidente é instaurado ou admitido, há uma determinação de que todos as ações que tramitem em Varas de primeiro e segundo graus, vinculados ao Tribunal de admissão do IRDR, e que versem sobre o tema em questão, estarão automaticamente suspensos por um ano, prazo em que o incidente deverá ser discutido e julgado.
Decorrido o prazo legal para o trâmite do IRDR e de seu julgamento, o Tribunal poderá valer-se de tese que vincule.
A instauração de um incidente de demandas repetitivas necessita de autorização do órgão colegiado que seja competente para o seu Julgamento, a exemplo dos Tribunais de Justiça do Estado, no caso de Justiça Residual, conforme artigo 978, como se observa:

Art. 978 – O julgamento do incidente caberá ao órgão indicado pelo regimento interno dentre aqueles responsáveis pela uniformização pela jurisprudência  do tribunal.
Parágrafo único – O órgão colegiado incumbido de julgar o incidente e de fixar a tese jurídica julgará igualmente o recurso, a remessa necessária ou o processo de competência originária de onde se originou o incidente. (Lei 13.105-2016)

            Assim, inicialmente, a competência para julgamentos do novo instrumento fica a cargo das Câmaras Cíveis que se encarregam de uniformização de jurisprudência, ou das que se encarregam de tais tipos de demandas com tanta frequência, de acordo com o regimento interno de cada um dos Tribunais.
         É importante aqui reconhecer a devida importância que o novo CPC atribui ao princípio da publicidade dos atos judiciais, de acordo com o que dispõe sobre a divulgação da instauração de IRDR acerca de alguma matéria específica:

Art. 979 – A instauração e o julgamento do incidente serão sucedidos da mais ampla e específica divulgação e publicidade por meio de registro eletrônico no Conselho Nacional de Justiça.
§ 1º Os tribunais manterão banco eletrônico de dados atualizados com informações específicas sobre questões de direito submetidas ao incidente, comunicando-o imediatamente ao Conselho Nacional de Justiça para inclusão no cadastro.
§ 2º Para possibilitar a identificação dos processos abrangidos pela decisão do incidente, o registro eletrônico das teses jurídicas constantes do cadastro conterá, no mínimo, os fundamentos determinantes da decisão e os dispositivos normativos a ela relacionados.
§ 3º Aplica-se o disposto neste artigo ao julgamento de recursos repetitivos e da repercussão geral em recurso extraordinário. (Lei 13.105-2016)

           
A formação de um banco de dados que possibilite consulta pública pode elucidar tanto magistrados quanto operadores do direito em suas tarefas diárias no que diz respeito às suas atuações no interior do sistema judiciário frente às causas de certa complexidade, que se revelem interdependentes de decisões relativas a grandes demandas, em números que muitas vezes superam as centenas e os milhares.
É certo que estas questões merecem análise mais detalhada, bem como a verificação das consequências das decisões que as cercam em vários contextos, a saber social, econômico, político, entre outros que possam afetar tanto pessoas físicas quanto jurídicas e, ainda, o direito público, o cidadão, entre outros que merecem ter seus direitos protegidos, evitando decisões precipitadas e conflitantes, que gerem a sensação de insegurança em relação à aplicação das normas legais.


4.   Aplicação ao caso concreto: o IRDR nos Tribunais
Mal o novo Código de Processo Civil, lei 13.105 entrou em vigor e os Tribunais trataram de empregar o novo instrumento disponibilizado na Lei, ou seja, verificaram os casos de cabimento do IRDR.
Desta maneira, podemos citar uma série de Tribunais que, a partir do início de junho já publicavam os primeiros casos surgidos em cada um dos órgãos.
O primeiro deles parece ser o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (GALLI, 2016), no dia 06 de junho, admitiu o seu primeiro IRDR, criado pelo novo CPC. Trata-se de um caso que envolve reiteradas decisões do Juízo da Vara de Execuções Fiscais do DF, no qual o Magistrado declara sua incompetência para processar honorários de sucumbência referentes a mais de 18 mil execuções fiscais.
O pedido do IRDR foi efetuado pela Procuradoria Geral do Distrito Federal – PGDF -, uma vez que as decisões estariam comprometendo a efetividade da recuperação dos créditos fiscais, de acordo com Galli.
Ainda nos diz que a Procuradoria Geral do Distrito Federal já interpôs mais de 12 mil agravos de instrumento, em que questiona a tal declaração de incompetência para o julgamento de honorários sucumbenciais. (GALLI, 2016)
Instaurado o IRDR, o relator do caso, Desembargador José Divino de Oliveira, determinou, como figura na Lei 13.105 2016, a suspensão dos efeitor de todas as decisões que haviam sido questionadas pela PGDF, impedindo qualquer prática de algum ato processo até que se julgue o IRDR, decorrido o prazo final de julgamento.
O Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP – também admitiu em maio de 2016 o processamento do seu primeiro IRDR. Este, trata de uma discussão acerca de aplicações junto a uma instituição financeira que foi liquidada extrajudicialmente em 2013, de maneira que somente parte dos valores investidos pelo cidadão comum foi resgatada. Os casos discutem o recebimento de uma diferença de valores entre os das aplicações e os das liquidações, uma vez que somente parte dos valores investidos têm sido resgatados, baseados nos limites estabelecidos pelo Estatuto do fundo na época da intervenção. Trata-se do IRDR nº 2059683-75.2016.8.26.0000.
Em função destas evidências, o fundamento usado para a instalação do IRDR é de que há incontáveis demandas similares em tramitação no Foro, com idênticos pedidos e causas de pedir, mas principalmente, a presença de evidentes divergências jurisprudenciais sobre as teses em debate.
As repetições da mesma controvérsia de direito, revela a insegurança jurídica, além de favorecer a existência de decisões conflitantes, sendo o requisito básico para o cabimento do IRDR. Admitido o instrumento, todos os processos vinculados ao Tribunal que apresentavam questão semelhante foram imediatamente suspensos.
Ainda em 23 de maio de 2016, tem-se notícia de que o Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por decisão do Grupo de Câmaras de Direito Público, admitiu o seu primeiro IRDR no âmbito do seu Poder Judiciário.
Visando fomentar um modelo de jurisdição democrática e participativa, o Tribunal primará pela uniformização do entendimento sobre certo tema, sempre que se revelar necessário, diante das decisões conflitantes que existam nos juízos que integrem o Tribunal.
Desta vez, a matéria que foi objeto da controvérsia reporta-se a questão de direitos fundamentais, vez que discute a necessidade de ser ou não ser comprovada a carência de recursos financeiros do cidadão que reclama por medicamentos ou procedimentos médicos e de outras áreas de assistência à saúde junto ao SUS. Constatadas mais de 25 mil demandas repetitivas no âmbito do TJSC, o julgamento do IRDR objetiva oferecer tratamento isonômico aos que buscam este tipo de atendimento.
Assim, com os processos suspensos o Tribunal tem a oportunidade de debater sobre o tema, em busca de soluções. Abre, inclusive, a possibilidade de participação das partes, prevista no novel CPC, uma vez que cogita a realização de audiência pública para discussão da matéria.

A audiência pública é uma faculdade, uma maneira de coletar muitas informações sobre o tema, mas o que se pretende é levar o incidente à discussão, com amplo debate sobre a questão controvertida, inclusive com o objetivo de promover a audição de palestras de pessoas com vasta experiência na matéria.
O relator da apelação que deu  origem ao IRDR, Desembargador Ronei Danielli, explica o funcionamento do IRDR, destacando que sua instauração depende de autorização do órgão colegiado competente para julgá-lo, e neste caso, especificamente, as Câmaras de Direito Público.
Observamos, na ocasião, que os efeitos resultantes do IRDR, devem manter-se restritos à matéria objeto de deliberação, embora seja possível posteriormente, a discussão de temas que lhe sejam conexos.

Em seu art. 977, o CPC autoriza a iniciativa de instauração do IRDR por magistrado do 1º Grau, além do Ministério Público, da Defensoria Pública, ou das Partes. E esta, sim, representa a máxima inovação, sendo exatamente neste ponto que a estrutura de composição do IRDR no novel CPC tange os fundamentos de construção na common law. Como se observa, a lei é clara no que se refere aos Juízes:

Art. 977 – O pedido de instauração do incidente será dirigido ao presidente do tribunal:
I – pelo juiz ou relator, por ofício;
II – pelas partes, por petição
III – pelo Ministério Público ou pela Defensoria Pública, por petição.
Parágrafo único. O ofício ou a petição será instruído com os documentos necessários à demonstração do preenchimento dos pressupostos para a instauração do incidente. (Lei 13.105-2016)

Isto significa que instaurar IRDR não é ato exclusivo de magistrados, promotores e defensores, mas também das partes. Ocorre que o magistrado pode realizá-lo “por ofício”. Ou seja, cabe ao juiz de primeira instância, detectar a incidência de resoluções conflitantes em casos  de matéria idêntica e constatar tanto a necessidade quanto a conveniência e o cabimento do IRDR.
Da mesma forma que os Juízes ingleses diziam a Lei ao caso concreto e, a partir destes atos judiciais formavam-se precedentes a serem respeitados e avaliados em caso de decisões que se assemelhassem, assim também os Juízes brasileiros estão em vias de construir precedentes, ao tornar os processos que apresentem altas demandas, regidos por matéria idêntica ou que apresente alto grau de insegurança jurídica, casos jurisprudenciais, casos de IRDR.
O Tribunal de Justiça de Sergipe, em diferentes meses de 2016, apresentou uma série de IRDRs, os quais discutem entre outros assuntos, desde a Competência da Justiça Estadual, situação de servidores públicos, cargos comissionados, e direitos, práticas abusivas, pensão por morte, cabimento e efeitos, entre outros assuntos que precisam de IRDR.
Além destes, o TJMG, visando maior celeridade dos processos, comunica a instauração de IRDR, “quando ocorrer a repetição de processo que contenham risco de controvérsia no julgamento que versem unicamente sobre questão de direito [...]”
E aborda a aplicação da tese jurídica que se estenderá a todos os processos suspensos, de idêntica matéria que tramitem na área do Tribunal, bem como aos casos futuros que contenham os requisitos já discutidos.
Para o desembargador Luiz Felipe Francisco, membro da recém-criada Seção Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro – TJRJ, o IRDR constitui uma “técnica que estabelece uma espécie de uniformização na apreciação dos processos que versam sobre o assunto [no primeiro caso do TJRJ, sobre a aplicação de 11,98% nos proventos dos servidores que ficaram sujeitos à perdas decorrentes da conversão da moeda em URV (Unidade Real de Valor) para o Real, em 1994, além de parcelas eventualmente devidas de forma retroativa].
O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro já disponibiliza em arquivo digital os processos com cabimento de IRDR, podendo ser acessado por operadores do direito por meio de senha,como se observa por este exemplo:
Parte superior do formulário
Processo No: 0023205-97.2016.8.19.0000

TJ/RJ - 14/9/2016 4:30 - Segunda Instância - Autuado em 11/5/2016


Classe:
INCIDENTE DE RESOLUCAO DE DEMANDAS REPETITIVAS
Assunto:
Alimentação / Garantias Constitucionais / DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO
  
  
Órgão Julgador:
OE - SECRETARIA DO TRIBUNAL PLENO E ORGAO ESPECIAL
Relator:
DES. NILDSON ARAUJO DA CRUZ
ARGUENTE:
JUÍZO DE DIREITO DA 5ª VARA DE FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DA CAPITAL
Réu:
  

Processo originário:  0135325-80.2016.8.19.0001
RIO DE JANEIRO CAPITAL 5 VARA FAZ PUBLICA
  
FASE ATUAL:
Conclusão ao Relator para Despacho/Decisao POR ORDEM VERBAL
Data do Movimento:
21/07/2016 17:12
Magistrado:
Relator
Motivo:
Despacho/Decisao
Magistrado:
DES. NILDSON ARAUJO DA CRUZ
Órgão Processante:
OE - SECRETARIA DO TRIBUNAL PLENO E ÓRGÃO ESPECIAL
Destino:
GAB. DES NILDSON ARAUJO DA CRUZ
  
SESSAO DE JULGAMENTO 
  
Data do Movimento:
16/05/2016 13:00
Complemento 1:
Admissão
Complemento 2:
Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva
Complemento 1:
Admissão
Complemento 2:
Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva
Data da Sessão:
16/05/2016 13:00
Antecipação de Tutela:
Não
Liminar:
Não
Presidente:
DES. LUIZ FERNANDO RIBEIRO DE CARVALHO
Relator:
DES. NILDSON ARAUJO DA CRUZ
Designado p/ Acórdão:
DES. NILDSON ARAUJO DA CRUZ
Decisão:
Admitido o Incidente de Resolução de Demanda Repetitiva - Unânime
Texto:
Por unanimidade de votos, foi admitido o Incidente, nos termos do voto do Desembargador Relator. Lavrará o acórdão o Exmo. Sr. DES. NILDSON ARAUJO DA CRUZ. Participaram do julgamento os Exmos. Srs.: DES. NILDSON ARAUJO DA CRUZ, DES. NAGIB SLAIBI FILHO, DES. ADRIANO CELSO GUIMARAES, DES. ELISABETE FILIZZOLA ASSUNÇÃO, DES. ODETE KNAACK DE SOUZA, DES. CELSO FERREIRA FILHO, DES. JOSE CARLOS MALDONADO DE CARVALHO, DES. ANTONIO JOSE FERREIRA CARVALHO, DES. HELDA LIMA MEIRELES, DES. ANA MARIA PEREIRA DE OLIVEIRA, DES. CARLOS SANTOS DE OLIVEIRA, DES. MARCOS ALCINO DE AZEVEDO TORRES, DES. GABRIEL DE OLIVEIRA ZEFIRO, DES. CUSTODIO DE BARROS TOSTES, DES. CLAUDIO BRANDAO DE OLIVEIRA, DES. LUIZ ZVEITER, DES. ANTONIO EDUARDO FERREIRA DUARTE, DES. NILZA BITAR, DES. CAETANO ERNESTO DA FONSECA COSTA, DES. MARIA INES DA PENHA GASPAR, DES. MARIA AUGUSTA VAZ MONTEIRO DE FIGUEIREDO, DES. REINALDO PINTO ALBERTO FILHO e DES. MILTON FERNANDES DE SOUZA. Impedido o Exmo. Sr. DES. CAMILO RIBEIRO RULIERE.
  
PUBLICAÇÃO DO ACORDÃO 
  
Data da Publicacao:
20/05/2016
Folhas/Diario:
119/120
Número do Diário:
2451564


 INTEIRO TEOR

Íntegra do(a) Despacho Em Mesa - Data: 16/05/2016  
Íntegra do(a) Acórdão - Data: 19/05/2016  
Íntegra do(a) Decisão Indefinido - Data: 02/06/2016  
Íntegra do(a) Despacho Em Mesa - Data: 20/06/2016  
Íntegra do(a) Despacho Mero expediente - Data: 11/07/2016   


Parte inferior do formulário
PALÁCIO DA JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - FÓRUM CENTRAL
Av. Erasmo Braga, 115 - Centro / CEP: 20020-903 - Rua Dom Manuel, 37, Centro / CEP: 20010-090 / Tel.: (0xx21) 3133-2000
Horários de funcionamento: Serventias Judiciais - 11h às 18h | Varas da Infância e da Juventude - 09h às 18h | Juizados Especiais e Adjuntos - 10h às 18h



Uma Câmara formada por 22 desembargadores discute a questão, sendo o prazo de 01 (hum) ano, para a decisão. Cabe ao juiz de primeiro grau, aplicar o padrão decisório  estabelecido, ao caso concreto.
Também o Tribunal de Justiça da Bahia -  TJ-BA – admitiu a instauração de quatro IRDR, proposto pela Procuradoria Geral do Estado da BA. Estes versam sobre questões de vigência legal, curso de prazo de prescrição, os quais possibilitarão a formação de precedentes obrigatórios no que se refere aos temas em questão.

5.   Breve conclusão
A construção de Bancos de Dados, bem como a disponibilidade dos instrumentos de IRDR pelos Tribunais de Justiça do país inteiro, acompanhados de resoluções, permitirão aos operadores do direito não somente acompanhar as decisões nos casos em que  as matérias idênticas se repetem em centenas e milhares de casos individuais e coletivos, particulares e públicos, mas que se possa ter um controle sobre as decisões do Judiciário no que se refere a questões polêmicas, casos em que a Lei é omissa ou contraditória, entre outras questões relevantes do Direito Civil.
Acreditamos que este instrumento, se adequadamente utilizado, vem para tornar a justiça mais absoluta e menos relativa, de maneira que não se imagine que ainda possam nela sobreviver ranços de aplicações de leis específicas e uns e diferentes a outros, como ocorria no Brasil Imperial, quando se faziam diferenças nas aplicações aos que se regiam pelos Privilégios e aos que se submetiam às Ordenações, determinando assim, duas classes de indivíduos: os que se valem da justiça e os que dela são desvalidos.
Preferimos crer que o instrumento não será usado para suspender quantidades imensas de processos que vão em prejuízo de pessoas  jurídicas que não respeitam os Direitos dos Consumidores ou as Leis Ambientais e, para não serem punidas imediatamente solicitem IRDR para suspender todos os processos que lhe movem. 
Parece interessante pensar que o instrumento assegurará o princípios da isonomia, da competência do Juiz Natural, da lógica jurídica, da segurança jurídica, da publicidade, da liberdade de expressão, entre outros princípios que garantem a aplicação do Direito, garantindo as benesses já conquistadas por meio da Constituição de 1988 e os Acordos Internacionais.

BIBLIOGRAFIA

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CEZARIO, Leandro Fazollo. A estrutura jurídica na Colônia. Criação, ordenação, implementação. Âmbito Jurídico. In: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=7088

RICALDE, Maria do Carmo. VERAS, Ney Alves. Novo Código de Processo Civil Comparado. 1ª edição. Campo Grande: Editora Contemplar, 2015.

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Assessoria de Imprensa.Tribunal de Justiça de Minas Gerais - TJMG. Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas. In: http://www.tjmg.jus.br/portal/legislacao/novo-cpc/novidades/detalhes-6.htm

Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Desembargador solicita a instauração do primeiro Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas   . In: http://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/noticias/2016/abril/solicitada-instauracao-do-primeiro-incidente-de-resolucao-de-demandas-repetitivas-no-tjdft


Um comentário:

Daniel F Silva disse...

Excelente trabalho. Parabéns!