segunda-feira, 13 de novembro de 2017



EFEITOS DA IMPUGNAÇÃO NA DEFESA DO  CONTRIBUINTE DEVEDOR
                                                                                  Rosangela Manhas Mantolvani (UFMS – Bacharelado em Direito)

EMENTA:   1. Processo Tributário – Conceito e diferenças.   – Princípios norteadores - 2. Da impugnação aos autos de Infração do contribuinte devedor - 3.  A impugnação administrativa  -  4.  O ônus da prova no processo tributário administrativo - 5. Dos Recursos no processo administrativo .           


1.      Processo Tributário – Conceito e diferença

Iniciaremos esta abordagem, definindo e conceituando o processo tributário e diferenciando o processo administrativo tributário do processo tributário judicial.
O processo tributário pode, grosso modo, ser conceituado como o conjunto de atos, e procedimentos que atendem normas administrativas, quando na esfera do processo administrativo fiscal; ou do processo judicial tributários, quando é regido por leis, decretos, portarias, entre outras, no âmbito do direito tributário.
A possibilidade de impugnação dos atos administrativos é um direito que tem o contribuinte e, por meio deste, surge o processo administrativo que, conforme Machado Segundo (2017, p. 41), estrutura-se assim:

Como qualquer outra atividade estatal, submetem-se, naturalmente, aos princípios norteadores da conduta do Estado de uma maneira geral, [...] como a justiça, a segurança, a isonomia, a proporcionalidade, a razoabilidade, a proporcionalidade e a publicidade.
Dada sua natureza, não meramente procedimental , mas também processual, visto que propicia a participação dos interessados na formação do resultado final (que, no caso, é a solução de uma lide, um conflito de interesses), instrumentalizando o exercício de atividade com função jurisdicional exercida de modo atípico pelo Poder Executivo, o processo administrativo submete-se também a princípios gerais, tais como o devido processo legal, a ampla defesa, o contraditório, o duplo grau de jurisdição, a instrumentalidade, e a economia processual.
Ao processo administrativo não se aplicam os princípios inerentes à atividade administrativa típica, ou seja, a atividade executiva exercida no âmbito dos meros proceidmentos, como é o caso da inquisitoriedade e da subordinação hierárquica. (MACHADO SEGUNDO, 2017, p. 42-43).

Assim, o poder executivo exerce de maneira atípica a função do julgamento. A utilidade do processo administrativo consiste na admissão de que o mesmo pode equivaler a uma “tutela jurisdicional”, no nível daquela do poder  judiciário, ou seja, impede que as partes envolvidas sujeitem-se a danos irreversíveis  no âmbito jurisdicional.
Não raras vezes, porém, o Fisco lança ônus ilegais aos contribuintes, e de alguma forma impõe certo tipo de coação para que efetue o pagamento, mesmo que este tenha imputado defesa no âmbito do processo administrativo.
A EC nº 45, de 2004, fez a inserção do princípio do devido processo legal e da razoável duração do processo, de maneira que no art. 5º,  inciso LXXVIII, segundo a qual, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados  a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. Como se percebe, a duração razoável do processo, estende-se ao administrativo.
Se o gravame imposto pelo Fisco é inconstitucional, mas estes fatos ainda estão sendo avaliados pela administração pública, fica impedido o Ministério Público de apresentar denúncia  penal por crime de redução de tributo ou de supressão.
A autoridade administrativa, ao julgar um processo administrativo tributário também está sujeita aos princípios processuais e constitucionais e não somente às regras da Administração pública.
O poder hierárquico, que não se apresenta no âmbito do judiciário, possui enorme influência no âmbito administrativo, de maneira que a autuação de um fiscal pode bem ser anulada por um agente superior hierarquicamente, ou seja, uma chefia superior a quem foi conferido tais poderes.  Estes procedimentos de revisão de autuações ocorrem com grande intensidade no âmbito do processo administrativo tributário.
           

2        Da impugnação aos autos de Infração do contribuinte devedor.

            Os princípios do Estado de Direito e do devido processo legal são a base da legalidade dos atos da Administração pública  que viabilizam a existência de um processo administrativo. É este que os legaliza. Tal que não podem estas regras que dão direito de petição ao contribuinte serem destituídas por um legislador infraconstitucional.
            O processo administrativo é normatizado pela Lei 9.784, de 1999, e pode ser aplicada por analogia a todo e qualquer órgão de tributação do Fisco que não tenha uma legislação específica. Pode também ser aplicado sempre que não ofenda os dispositivos do Decreto 70.235, de 1972.
            A impugnação é uma petição que trata de demonstrar que o ato do órgão tributário não procede, ou seja, que está sujeito a anulação ou revisão.
            Sob esta perspectiva, os atos de lançamento, de indeferimento de parcelamento de dívida, de rescisão de parcelamento, de ato de lançamento, de indeferimento de isenção, de exclusão ou inserção de contribuinte em programa de PERT ou de REFIS, entre outros que são passíveis de impugnação, figurando como objetos de questionamento perante a própria Administração Pública.
            Este ato de questionamento constitui o chamado processo administrativo propriamente dito. Neste tipo de procedimento a participação daqueles que estão envolvidos  no processo têm participação assegurada, estando também garantidos os princípios da ampla defesa e do contraditório.
           
3.  A impugnação administrativa
           
Quando o lançamento se dá por homologação, como no caso da expressa apuração feita pelo sujeito passivo, uma corrente de juristas entende que não é passível de  impugnação, uma vez que o próprio contribuinte apurou o valor do tributo devido. Um exemplo clássico deste modelo seria o Imposto de Renda, como se apresenta no modelo atual, com declaração feita online pelo próprio contribuinte. E neste sentido temos vários acórdãos que dispensam o processo administrativo, e legitimam a execução fiscal, a exemplo de processo administrativo para cobrança de dívida quando o lançamento e o crédito quando se trata de caso típico de autolançamento, desqualificando os efeitos da homologação formal , conforme art. 150 do Código Tributário Nacional , não configurando violação à Lei Federal.
A Súmula 436 do STJ consolida que o reconhecimento de débito fiscal entregue em declaração pelo contribuinte, constitui crédito tributário, estando o órgão do Fisco dispensado de qualquer outra providência.
Como se observa, está determinado na Jurisprudência, o que não impede que outros entendimentos sejam adotados.
A obrigação tributária é decorrente de lei. É por isso que, mesmo que o tributo tenha lançamento por homologação, não está excluído de apreciação legal por parte da administração do órgão do fisco. Sempre é possível pleitear a restituição do indébito, independentemente se o valor pago do tributo indevido tenha decorrido do contribuinte ao declarar ou não.
A este pedido de restituição de valor indevido pelo contribuinte ao fisco denominamos processo administrativo. É o ato de pedir a restituição do valor que gera o processo.
No caso de tributo cujo lançamento foi efetuado, mas ainda não quitado pelo contribuinte, também é passível de impugnação, uma vez que ainda não procedeu ao recolhimento.
Para Alberto Xavier (apud Machado Segundo, 2017, p. 110-111) o fato de a jurisprudência considerar que uma vez homologado, o crédito é certo, inexistindo necessidade ou possibilidade de impugnação, na verdade,  esta orientação é “violadora dos princípios fundamentais  do Estado de Direito, de disposições da lei complementar e da lei ordinária”. E, ainda, demonstra em seu livro “Do Lançamento – Teoria do Ato, ...”, que o tal consenso se sustenta sobre um entendimento com premissas equivocadas, incompatíveis com o Código Tributário Nacional, especialmente o disposto no art. 142, do CTN.
Assim, a partir da análise do livro de Alberto Xavier, que considera como profunda reflexão sobre o assunto, Hugo de Brito Machado Segundo (2017, p. 111),  afirma que deve ser assegurado o direito de defesa ao sujeito passivo, em caso de homologação de crédito tributário, em caso de declaração pelo próprio contribuinte.
Entre outros exemplos e comentários sobre o processo administrativo tributário, cita o caso do Ceará, cujo tributo tem lançamento por homologação quando declarado pelo próprio contribuinte, o “autolançamento”.  No entanto, não é pago. Antes, é submetido a um processo administrativo sumário. Entende-se que sendo a apuração feita pelo próprio contribuinte os pontos de divergência tendem a ser menores.
É importante salientar que a Fazenda Pública só pode dispensar o processo tributário quando homologa a apuração do tributo devido, em forma de autolançamento, sem qualquer alteração daquela apresentada pelo contribuinte. Se não apresentado nestas condições, se houver ocorrência de vários fatos que alterem esta situação, então serão interpretados sob a ótica das normas que se possam aplicar ao caso, quando ocorre a homologação de valor diferente daquele declarado pelo contribuinte e homologado pela autoridade do fisco. Neste caso, o sujeito passivo não dispensa o exercício do direito de defesa e, como resultado, a instauração de um processo administrativo que contenda com o órgão da administração para sua defesa.
Conforme Machado Segundo (2017, p. 113), se a autoridade formular exigências diferentes daquelas que forem apuradas pelo próprio contribuinte, “tem este o direito à impugnação, sob pena de cerceamento de direito de defesa”.
De acordo com a jurisprudência dominante, a autoridade do fisco precisa aproveitar toda a apuração e o sentido jurídico e contábil declarado pelo contribuinte ao fato divergente. Se não for assim, está-se diante de divergência e, por isso, há garantia de processo administrativo para apurar a “verdade material dos fatos”.
Um exemplo dado é sobre a recolha do COFINS, quando o contribuinte declara apuração de certo valor faturado, porém não  recolhe por entender que é isento. Não poderá ser feito um lançamento por “homologação”. Antes, é preciso “mudar “ o valor da apuração e depois resolver a questão. Mas esta mudança torna o direito de defesa do sujeito passivo algo indispensável.
O Fisco sempre necessitará homologar as apurações  e fazê-las suas para que possa executar o sujeito passivo e obter êxito. Caso contrário, poderá ser ela a sucumbente.
Quando o Fisco toma posse da declaração que o contribuinte apresentou, se quiser executá-lo sem instaurar processo administrativo, nem dar-lhe oportunidade de defesa, poderá fazê-lo, porém, o prazo de prescrição contado a partir desta data, será de cinco anos.

4.  O ônus da prova no processo tributário administrativo

            A fundamentação nos processos tributários é essencial, uma vez que se suportam em atos administrativos, assim os fatos são as justificativas do fazer , seja de um ato de lançamento que deve ser descrito e comprovado pela autoridade competente que houve tal emissão.
            Somente assim pode ser homologado.
            Se os fatos não forem comprovados pela autoridade do órgão do Fisco, não tem o sujeito passivo a obrigação de produzir prova para demonstrar que tais fatos não ocorreram. Ao contrário, não é ele quem deve provar, mas sim exigir que o ato possui ausência de comprovação e, portanto, é nulo, ou seja possui falta de fundamentação ou não possui qualquer prova concreta dos fatos descritos, comprobatórios do valor a ser lançado e, portanto, homologado.
            Assim, no processo administrativo, o ônus da prova é dividido entre o sujeito ativo e o passivo, tal qual no processo judicial.
            O órgão da administração pública é que tem a incumbência de demonstrar que os fatos afirmados de fato existem, enquanto o devedor tem que provar os fatos que impedem tal execução, pois são impeditivos ou modificativos, maneira que nulificam o processo, ou extinguem o futuro crédito tributário.
            Assim, a busca da verdade material dos fatos fará com que o processo administrativo se valha da apreciação de provas, que poderão demonstrar a ocorrência dos fatos, de tal maneira que elucide a situação . As provas serão dispensáveis quando prescindíveis ou impossíveis de serem praticadas, ou  apresentadas.
            A Lei 9.784, de 1999, dispõe que a prova dos fatos deve ser atribuído seu ônus ao órgão do Fisco que possua competência para a instauração do processo.
            No processo administrativo, a inversão do ônus da prova é elemento que se impõe por preservar a situação do devedor, de maneira que o órgão fiscalizador do tributo arcará com o ônus de levantamento de provas, inclusive promovendo perícias com o objetivo de estabelecer o fato gerador do tributo, além de  promover a ideal “confissão” da dívida pelo contribuinte, o que facilita a ação do Fisco.
            O processo administrativo tributário promove, entre outros procedimentos, a oitiva de testemunhas, além da prova emprestada, que pode ser usada pelo sujeito passivo ou pelo ativo, no sentido de demonstrar que aquilo que serviu de prova ao processo do terceiro, aplica-se ao mesmo caso.
            Assim, se as provas contra determinada empresa foram usadas em um processo de apreensão de mercadorias pelo Fisco Federal, então, a empresa que consumia estes produtos e que também foi apanhada, já está comprometida com as provas que podem ser exibidas, sejam estas em seu favor ou desfavor.

5. Dos Recursos no processo administrativo        

O processo administrativo pode ter decisões colegiadas de primeiro grau e também pode funcionar em segundo grau, quando o mesmo pode ser enviado pela parte passiva a dois tipos de recurso em instância diferente, em órgãos especiais de competência para tanto.
            Os recursos podem ser voluntários ou “de ofício”.
O recurso “de ofício” é aplicado sempre que o órgão fiscalizador prevê a possibilidade de reexaminar a questão que lhe pareça. E quanto ao  recurso voluntário é quando se verifica a possibilidade ou exigência de juntada de documentos ou provas, além de perícias e outros elementos que permitam o reexame.
No que diz respeito ao termo “voluntário”, vale frisar que todo recurso é voluntário, pois depende da vontade dos sujeitos envolvidos no processo administrativo.
Uma vez feito o julgamento de mérito no órgão que julgará a impugnação, poderá o sujeito passivo, não satisfeito com o exame que foi feito no processo administrativo tributário, bem como com seu resultado, pode então impetrar o recurso voluntário ao órgão de “segundo grau”, ou especial de competência para tal.
Neste ínterim torna-se fundamental verificar quais destes possuem competência para determinar a admissibilidade do recurso. Se o recurso foi interposto no tempo adequado, tem-se que a legislação específica que o rege determinará os demais passos do processo e seu reexame. Por outro lado, se intempestivo, poderá o órgão competente deixar de conhecer o recurso, subtraindo-lhe o direito de reexame.
Vale destacar que a Lei 9.784, de 1999, possui todos os passos para a formulação do processo administrativo tributário, bem como os prazos que o sujeito passivo dispõe para a apresentação da petição inicial, cuja exordial é conhecida pela Impugnação e dispõe normalmente do prazo de 30 (trinta) dias, após o recebimento da intimação de que há irregularidade no “autolançamento”, por parte do fisco ou em outro tipo de constatação de crédito tributário. Assim que o órgão do Fisco verifica a situação, e notifica o contribuinte do tributo, inicia-se a contagem do prazo. Dentro deste prazo, deve o devedor apresentar a Impugnação.




BIBLIOGRAFIA

BRASIL. Constituição Federal da República Federativa doBrasil, de 1988.
BRASIL. Emenda Constitucional Nº 45, de 2004.
BRASIL. Decreto 70.985, de 1972.
BRASIL. Lei 9.784, de 1999.
CEARÁ, Lei 12.732, de 1997, artigo 45, Recurso Especial.
CEARÁ, Lei 12.732, de 1997, artigo 45. Recurso Extraordinário.

DOUTRINADORES:

MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brito. Processo Tributário. 9ª ed. rev e at. . São Paulo: Atlas, 2017.

XAVIER, Alberto. Do Lançamento. Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo Tributário. 2. Ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997.











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